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O APRENDER VEM ANTES DO ENSINAR!

Teorias não críticas,  crítico-reprodutivistas e da Pedagogia histórico-crítica
por Demerval Saviani
Para Saviani, as “Teorias não críticas” representam um conjunto de abordagens ou tendências pedagógicas que buscam explicar os problemas da educação brasileira, sobretudo o fenômeno da “marginalização educacional”, sob uma perspectiva conservadora, pois não vão à essência do problema fixando-se, apenas, na sua superficialidade. Compõem este conjunto de abordagens: a “Pedagogia Tradicional”, a “Pedagogia Nova” e a “Pedagogia Tecnicista” (ibid.)

(…) a sociedade é concebida como essencialmente harmoniosa, tendendo à integração de seus membros. A marginalidade é, pois, um fenômeno acidental que afeta individualmente um número maior ou menor de seus membros, o que, no entanto, constitui um desvio, uma distorção que não só pode como deve ser corrigida (ibid., p. 4).

A educação, de acordo com as abordagens citadas e mediante o contexto de desigualdade social, tem o papel de funcionar como “um instrumento de correção dessas distorções”.  Sob tal perspectiva, a função da educação “coincide, no limite, com a superação do fenômeno da marginalidade”. Defendem, de um modo geral, que enquanto a marginalidade existir “devem se intensificar os esforços educativos; quando for superada, cumpre manter os serviços educativos num nível pelo menos suficiente para impedir o reaparecimento do problema da marginalidade” (ibid.).

Trata-se, portanto, de concepções pedagógicas que entendem a educação apenas pelo seu caráter de serviçal do sistema social (o capitalismo).

Descaracteriza, assim, aquela que deveria ser a primeira função da educação, qual seja: a de promover o desenvolvimento do ser humano, bem como a satisfação de suas necessidades individuais e coletivas.

É neste mesmo cenário de desenvolvimento social capitalista que nasce um outro conjunto de teorias que, contrariando as primeiras, exercem a crítica rigorosa sobre a sociedade vigente. Nesta perspectiva, identifica-se um discurso no sentido de apontar a educação como um instrumento de reprodução/manutenção das condições já existentes na sociedade.

Tais teorias foram identificadas por Saviani como “Teorias crítico-reprodutivistas”. Para Saviani, este grupo de teorias:

(…) concebe a sociedade como sendo essencialmente marcada pela divisão entre grupos ou classes antagônicas que se relacionam à base da força, a qual se manifesta fundamentalmente nas condições de produção da vida material.

Neste quadro a marginalidade é entendida como um fenômeno inerente à própria estrutura da sociedade. (…) Nesse contexto, a educação é entendida como inteiramente dependente da estrutura social geradora de marginalidade, cumprindo aí a função de reforçar a dominação e legitimar a marginalização (ibid., p. 4-5).

Sobre as teorias apresentadas, Saviani diz que os estudiosos responsáveis pela elaboração das mesmas fizeram a análise correta sobre a sociedade capitalista, além de se empenharem “em compreender a escola no quadro da luta de classes”. No entanto, eles não encararam a escola “como palco e alvo da luta de classes” (ibid., p. 5).

Para as “Teorias crítico-reprodutivistas” a escola “não poderia ser diferente do que é” (ibid., p. 24). Até por este motivo, essas teorias não construíram nenhuma proposta pedagógica, elas apenas queriam explicar os mecanismos de funcionamento da escola enquanto instituição que é determinada pelo capitalista.

Ao deparar-se mais de perto com os dois conjuntos de teorias explicitadas anteriormente, Saviani levantou os seguintes problemas:

  1. “é possível encarar a escola como uma realidade histórica, isto é, suscetível de ser transformada intencionalmente pela ação humana?”

  2. “é possível uma teoria da educação que capte criticamente a escola como um instrumento capaz de contribuir para a superação do problema da marginalidade?” (ibid., p.25)

  3. Na busca para encontrar respostas aos problemas por ele formulado, Saviani se empenhou em construir uma outra teoria pedagógica. Foi assim que – partindo da crítica às teorias pedagógicas já existentes e, ao mesmo tempo, negando aquilo que não era útil à educação da classe trabalhadora, mas, conservando o que aquelas teorias tinham de positivo a seus interesses – Saviani lançou as possibilidades reais de construção de uma nova teoria pedagógica. Nasce, assim, a “Pedagogia histórico-crítica”.

Vimos até o momento como diferentes teorias pedagógicas (que dão sustentação a métodos e práticas pedagógicas específicas), elaboram suas explicações para um mesmo objeto, neste caso, a Escola.

Nesse sentido, acreditamos que o surgimento de uma determinada prática pedagógica é sempre motivado por necessidades sociais concretas que podem impor um caráter conservador à teoria/prática pedagógica ou, ao contrário, pode favorecer uma opção pedagógica que se oriente pela ação transformadora da realidade social.

Assim como em todos os setores que compõem a sociedade capitalista, também as teorias e práticas pedagógicas passam a assumir demandas específicas, originárias de interesses próprios de uma determinada classe social.  Vê-se, portanto, o antagonismo existente entre as classes que compõem a totalidade social ao ser tensionado em meio às disputas políticas, ideológicas, econômicas, culturais e pedagógicas.

Os interesses de classe são diferentes e antagônicos. Portanto, não se pode entender que a sociedade capitalista seja aquela onde os indivíduos buscam objetivos comuns, nem tampouco que a conquista desses objetivos depende do esforço e do mérito de cada indivíduo isolado (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 24).

TEMPORALIDADES FEMININAS 

Aquela mulher que rasga noite

 com o seu canto de espera

não canta

Abre a boca e solta os pássaros

 que lhe povoam a garganta

(Paula Tavares. In: Ritos de Passagem)

 

As mulheres, excluídas da história, tiveram de se fazer ouvir minando as concepções patriarcais e sexistas. A sua atuação se deu, inicialmente, dentro do espaço privado, atingindo o espaço público.  Mas, não só foi preciso fazer-se ouvir no espaço público, como, lá, iluminar uma outra lógica, mais subversiva, porque questionou as normas e os papéis preestabelecidos, levantando os tapetes que escondiam a incerteza, a pluralidade e a escolha.

A garantia da igualdade e da liberdade da condição feminina querer autonomia econômica  e pessoal para as mulheres. Isso quer dizer que, donas da própria vida, o seu corpo não pode ser objeto de mercantilização. Ainda mais quando se impõe um único padrão estético que incide sobre as questões de raça/etnia, geração, classe e orientação sexual.

Os territórios demarcados e a naturalização de características tidas como femininas (abnegação, dedicação, docilidade, passividade, pureza, sentimentalismo, etc.) geraram os meios desiguais de apropriação do capital cultural, de acesso aos meios de qualificação profissional e aos centros de poder. 

Hoje, a temporalidade é outra. Há uma gestão produtiva para as mulheres ancorada na autonomia, reconhecimento e visibilidade do trabalho feminino dentro ou fora do lar. Há o reconhecimento de mulheres de todas as formas, de todos os jeitos, de todas as cores. No entanto, ainda é imperativo analisar com atenção as áreas onde as desigualdades se manifestam, como se estruturam e como operam, a fim de perspectivarmos suas consequências e, desse modo, propomos caminhos de ruptura para a promoção da equidade, desfazendo as assimetrias de gênero, ou seja, as desigualdades de oportunidades, condições e direitos entre homens e mulheres, gerando uma hierarquia de gênero.

No contexto municipal, São Gonçalo desfruta de credibilidade e de avanços na promoção de uma agenda para a promoção dos direitos e defesa das mulheres. Órgãos como a Coordenadoria de Mulheres, incluindo o Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres, pertencente à Secretaria Municipal de Atenção ao Idoso, Mulher e Pessoa com Deficiência, tem conjugado uma ação intersetorial que inclui a assistência social, a saúde, e a educação, como os Centros de Referência da Assistência Social - CRAS, organizações não governamentais e Centros de Referência Especializados da Assistência Social, lidando com violações de direitos e fortalecendo seus efeitos de caráter preventivo.

Focalizando esforços para a otimização da rede de atendimento à mulher em situação de violência, foram criados centros especializados como o  CEOM  Zuzu Angel no bairro de Neves (atualmente em reforma) e o CEOM Patrícia Acioli no bairro de Jardim Catarina.

Os impactos positivos da atuação da Coordenadoria tem reverberado na promoção de cursos para a comunidade em geral e, particularmente, para agentes de segurança pública, como policiais militares e guardas municipais, em parceria com o Programa UFF-Mulher, assim como a OAB Mulheres em São Gonçalo. Trata-se de  uma formação na área dos direitos humanos e relações sociais de gênero das equipes que integram a rede social de proteção à mulher em situação de violência doméstica e de gênero do município de São Gonçalo.

Uma outra agenda que merece destaque é a promoção da Feira da Mulher Empreendedora de São Gonçalo - FEMESG - , projeto de geração, trabalho e renda com o objetivo de promover a autonomia econômica e a elevação da autoestima das mulheres. A isso soma-se a reunião mensal da Rede Mulher que promove uma roda de conversa para a articulação e a proposição de políticas públicas na efetivação das ações que promovam o protagonismo das mulheres, informando sobre direitos, serviços públicos, questões de gênero, entre outros temas de relevância social, cultural e político.

A Conferência Municipal de Políticas para as Mulheres que, em São Gonçalo,  caminha para a sua oitava edição, é outra agenda propositiva que traz a voz de movimentos sociais de mulheres e das mulheres com as mais diferentes experiências nos poderes Executivo, Legislativo e organismos institucionais, o que resulta em inúmeras contribuições para a ampliação e efetiva implementação das políticas públicas para a igualdade de gênero, fortalecendo os mecanismos de políticas públicas para as mulheres já existentes.

É certo que a promoção de políticas que garantam o acesso da população feminina brasileira a bens e serviços públicos fundamentais tem sido uma pauta do governo federal, estadual e municipal. Mas pauta é ideia, pôr a mão na massa é ação!

Não nos esqueçamos que o desafio que ainda persiste está na superação da divisão sexual do trabalho, na socialização do trabalho doméstico e de cuidados e, fundamentalmente, em políticas públicas que estimulem e apoiem atividades econômicas que permitam as mulheres igualdade de acesso a recursos produtivos e proteção social. É esse caminho que permitirá seguir revertendo a temporalidade de passarem da condição de narradas para as que narram e, assim, soltar os pássaros que lhe povoam a garganta.

Profª Drª Shirlei Victorino

Coordenadora Municipal de Educação Integral/SEMED/São Gonçalo - Rio de Janeiro  - rj

Conselheira dos Direitos da Mulher - CMDM-SG

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